quarta-feira, 4 de maio de 2011

Qual a quantidade ideal de brinquedos para o meu filho?

Para as crianças, o ato de brincar é mais importante do que ter brinquedos. Pais podem criar hábito de doar as peças que não são mais usadas 

As prateleiras das lojas infantis são semanalmente abastecidas com novidades e é impossível acompanhá-las. Mas quando sua casa parece apresentar mais opções de brinquedos do que uma loja é hora de se perguntar: seu filho precisa de tudo isso? Provavelmente não. Encher a criança de brinquedos pode ter a melhor das intenções, mas facilmente se torna um revés. De acordo com Maria Ângela Barbato Carneiro, coordenadora do Núcleo de Cultura e Pesquisas do Brincar da PUC-SP, ter muitos brinquedos dificulta o entendimento de limites e aumenta a possibilidade da criança se tornar um adulto consumista no futuro. Para evitar os excessos, a regra é básica: a necessidade da criança é brincar, não ter brinquedos.


Gabriela em meio a seus brinquedos: a mãe, Flávia, pede que parentes e amigos só levem presentes em datas comemorativas, como Natal e aniversário



Segundo a especialista, o aumento da aquisição de brinquedos pelas famílias é determinado pelas propagandas direcionadas às crianças, estimuladoras primeiras do consumismo infantil. “Mas elas não precisam de tantos objetos pra brincar. Tampouco estes objetos precisam ser os da indústria de brinquedos”, diz. Quem nunca viu o filho brincando com a caixa onde veio o brinquedo, sem dar a menor trela para o brinquedo em si? Objetos comuns como panelas, sapatos e pedaços de pano podem facilmente se tornar brinquedos nas mãos das crianças. “O importante mesmo é a ação de brincar”, afirma ela.


Disso a coordenadora de eventos Flávia Spielkamp, de 28 anos, tem certeza. A filha Gabriela, de quatro anos, vive andando para lá e para cá com uma maletinha cheia de objetos. Entre eles estão um garfinho, uma bonequinha de pelúcia e uma lanterna. “Essa maletinha é o brinquedo mais legal que ela tem hoje”, conta. Segundo o educador e antropólogo Tião Rocha, fundador do Centro Popular de Cultura e Desenvolvimento, o melhor brinquedo que os pais podem dar às crianças é aquele que estimula a imaginação: “Dar um boneco que fala e anda para a criança, por exemplo, é bobagem. É um brinquedo que brinca sozinho e, como ela não aguenta aquela repetição, o abandona rapidinho”.


Mais de dez minutos


Flávia se recorda de um conjunto de cozinha musical que a filha ganhou de presente. “Ela não consegue inventar nada de diferente com aquilo”, diz Flávia. A menina não passou mais de 10 minutos com o brinquedo. A diferença, explica Tião, reside na finalidade e nas possibilidades apresentadas pelo brinquedo. Alguns oferecem somente entretenimento e passatempo, sem chances de envolvimento criativo – e tendem a ser abandonados mais rapidamente. Se o quarto de uma criança estiver cheio deles, facilmente ela perderá o interesse pela maioria: “O que ela precisa é de uma oportunidade e um espaço para brincar e fantasiar. Os brinquedos devem estimular isso”.


Para o psicólogo Áderson Costa, especialista em desenvolvimento e professor do Instituto de Psicologia da Universidade de Brasília (UnB), alguns brinquedos podem colaborar para o desenvolvimento das crianças à medida que elas vão crescendo (veja os brinquedos certos para cada idade). E não necessariamente são aqueles mais tecnológicos e caros, como muitos pais devem imaginar.


Bebês que estão começando a engatinhar, por exemplo, preferem objetos coloridos e que mudam de forma, por aumentarem a curiosidade natural dos pequenos. Já crianças entre três e quatro anos se sentem muito instigadas por brinquedos de encaixe, que podem montar e desmontar. Para já alfabetizadas, atividades que envolvem regras – como jogos de tabuleiro – colaboram para a socialização. “São brinquedos que não necessariamente precisam ser industrializados”, afirma o especialista. Com material descartável, por exemplo, é possível construir brinquedos incríveis e ensinar os pequenos a construí-los.


Tião Rocha acrescenta que, aos olhos de uma criança, facilmente uma caixa de sapato pode virar um caminhãozinho. Já no dia seguinte, a mesma caixa pode ser uma casinha, e assim por diante. “Qualquer produto fechado em si mesmo é um empecilho à criação da criança”, diz. Um exemplo é quando a criança desmonta um brinquedo – consequentemente quebrando-o. “Ela quer saber como funciona. A durabilidade de um brinquedo é o tempo da curiosidade”, completa.


Muito mais que o brinquedo em si, portanto, o envolvimento dos pais no brincar da criança é realmente essencial. Em vez de se preocupar em adquirir produtos, o melhor é disponibilizar tempo e oportunidade para brincar com os filhos.


O ato de brincar, independentemente da quantidade de brinquedos à disposição, deve ser oferecido com qualidade. E claro, outras atividades também devem entrar na rotina. Segundo Maria Ângela, crianças que não têm oportunidade de ir ao teatro, brincar de esconde-esconde ou fazer uma cabaninha, por exemplo, facilmente se voltam à televisão como fonte única de entretenimento. “Se a criança tem diferentes oportunidades de criação e imaginação, é mais fácil perceber que não precisa consumir tanto”, diz.



Foto: Guilherme Lara Campos/FotoarenaAmpliar
Gabriela coloca brinquedos na caixa de doação: tradição instituída pela mãe ensina a praticar o desapego
Limites e reutilização


Quanto mais brinquedos a criança tiver, mais ela pode desejar. Muitas vezes a motivação deste desejo passa longe do uso lúdico e surge da influência do amiguinho da escola, que já tem um. Cabe aos pais colocar limites. “Se deixar, a criança consome tudo e um pouco mais”, afirma Flávia. Como familiares e amigos colaboram para o excesso trazendo brinquedos em visitas e festas, a mãe resolveu deixar claro que presente é só para datas comemorativas – aniversário e Natal – e olhe lá: “Não quero que deem presente para a Gabriela à toa”. Mesmo assim, ela já tem mais do que precisa.


Por isso, Flávia instituiu como tradição doar os brinquedos que já foram deixados de lado. “Desde pequena sentamos juntas e separamos os brinquedos que não despertam mais o interesse dela. Mesmo que diga ainda gostar de um ou de outro, ela aceita”, diz. Gabriela, mesmo aos quatro anos, entende que outras crianças irão brincar mais do que ela com aquele brinquedo. E aceita. “Faço isso para ela praticar o desapego e entender a dificuldade que é ter as coisas”, diz a mãe. 


O psicólogo Áderson Costa sugere uma estratégia: mostrar aos pequenos que um mesmo brinquedo pode ser utilizado de muitas maneiras diferentes. Os pais podem fazer uma competição para descobrir novas formas de usar o brinquedo: “Dessa forma, o objeto pode ser redescoberto e se tornar, mais uma vez, o melhor brinquedo do mundo”.


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